quarta-feira, janeiro 31, 2007

O Dia Mais Frio do Ano – Parte I

Costa da Caparica, Cova do Vapor - foto arquivo pessoal

Era Sexta, fui passar a noite a casa de uma amigo meu da Costa, a ideia era levantar cedo no Sábado e ir surfar a manhã.

Estava um frio invulgar para estas bandas, uns 5 ºC diria, e o que apetecia era mesmo recolher em casa… No que diria respeito ao programa da noite, estávamos bem entendidos, aquecedor, estirar no sofá e uma “televisãozita” a meio gás… Soava perfeito...

Nesta altura do ano sinto-me muitas vezes como que a entrar em hibernação. Fico muito menos activo, mais caseiro, mais virado para dentro… Assumo por completo um desagrado especial pelo frio e por esta estação, pelo menos no que toca ao clima… Leva-me sempre a um estado profundo de letargia e introspecção…

Bem, de uma forma simples e directa diria, antes, que fico menos de “cerveja na esplanada” e mais de “chá e torradas no aconchego do lar”… O que eu não dava para que Portugal fosse um daqueles países de água quente e surfezinho de calções!

O programa estava a ser cumprido a rigor… No sofá, embrulhados cada um com seu cobertor, curtíamos o sarcasmo e o humor do “Dr. House”… Naquele cenário acolhedor, franzia-me um pouco ao pensar na surfada marcada para a manhã seguinte… Eu até estava com alguma tosse, pensei… Até seria uma boa desculpa, não fosse eu estar sempre a dizer, que n há nada que um bom dia de surf não cure.

O telefone tocou… era o Zé…

- Como é Pedro, amanhã vamos surfar?
- É pá… eu estava a pensar em ir de manhã, mas...
- Vamos… Passei a semana toda a seco apetece-me mesmo ir ao mar.
- Sabes… Este frio é q me desencoraja um bocado… - Arrisquei.

- TU DEVES ESTAR A GOZAR COMIGO! Qual frio? Não me digas que ligas a isso?

Bolas, que intransigência, que paixão... Grande Zé! Até quase me senti envergonhado de por em causa uma surfada numa manhã gelada de Inverno… Quase…

- Bom, temos de ir, então! – Ri-me rendido. E lá combinámos a coisa…

Costa da Caparica, São João - foto arquivo pessoal

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Sobre a Beleza


A origem da beleza e do deslumbre estão muitas vezes relacionadas com o acaso e o imprevisto… Neste excerto do “American Beauty” ela apresenta-se na forma de um saco de plástico a esvoaçar, lembram-se?

"It was one of those days when it's a minute away from snowing and there's this electricity in the air, you can almost hear it. And this bag was, like, dancing with me. Like a little kid begging me to play with it. For fifteen minutes. And that's the day I knew there was this entire life behind things, and... this incredibly benevolent force, that wanted me to know there was no reason to be afraid, ever. Video's a poor excuse, I know. But it helps me remember... and I need to remember... Sometimes there's so much beauty in the world I feel like I can't take it, like my heart's going to cave in."

Durante esta cena, no cinema, lembro-me de ouvir umas quantas pessoas a rir, talvez afastando de si o embaraço da possibilidade de se emocionarem com tão descabida situação… Mas sim, atrás de qualquer coisa pode haver uma vida imensa que podemos escolher abraçar ou não!
Alguns encontram-na enquanto regam o quintal num fim de tarde estival, outros, de manhã, a beber um sumo de laranja acabado de espremer, frente a uma janela solarenta. Há aqueles que a encontram a escalar montanhas apenas porque elas estão lá, mas eu revejo-a, essa vida e esta beleza efémera e palpitante, nas ondas que são surfadas, nos jogos de leitura que se têm de efectuar, na adequação de linha e movimentos às secções e paredes que se nos apresentam… O nosso gesto respondendo ao da onda, a onda respondendo ao nosso gesto… num diálogo circular, como um saco de plástico a esvoaçar!

Deixo-vos um pequeno trecho do filme "Glass Love", de Andrew Kidman, que teve a imensa habilidade de o compor recheado de momentos como os que aqui descrevi:


“(…) don’t try to be on time (…)” – parte II

Casa de Pescadores - Caparica, foto arquivo pessoal

Parei na praia da Riviera, tinha por ali surfado há não muito tempo e os fundos pareciam, já na altura, estar-se a compor… Só havia um carro no parque de estacionamento, pareceu-me ser um bom pronuncio… levado pela curiosidade dei uns passos de corrida ansiosos até ao cimo da duna mais próxima… três dentro de água, não me tinha enganado… com o primeiro set evidenciou-se um pico de direitas que partiram rigorosas desde o outside ao inside… Surfei todo o seu comprimento com o olhar!

Uma mansão na Aroeira ou a simplicidade sobre o mar? - Caparica, foto arquivo pessoal


Olhei em volta todo o mar que do alto da duna se me oferecia… O céu metálico de Inverno reflectia-se na água quebrando em pedaços de brilho prata…

… nos meus olhos pedaços de céu quebrados na água…

Gostava da praia no Inverno, de vê-la assim desabitada e a revelar todo o seu espaço… Serena…

Quantas vezes desperdiçamos a beleza por a olharmos apressados?...

Casa de pescadores - Caparica, foto arquivo pessoal


Caparica, fotos arquivo pessoal

Inspirei…

…Fui pôr o fato!

segunda-feira, janeiro 15, 2007

“(…) don’t try to be on time (…)” – parte I

Pintura de Wade Konoakowsky - Startyoung

Na passada sexta tive uma manhã bastante ocupada com trabalho, mas consegui, apesar de tudo, assegurar parte da tarde para ir surfar e desfrutar o off-shore na Caparica.

Estava com tempo suficiente para ir a rolar serenamente de carro e ainda iria checar a melhor praia para entrar… A tarde envolvia-se da luz branca típica duma tarde de Inverno, estava frio mas não o suficiente para me demover da ideia de surfar… Liguei o rádio e o locutor anunciou uma música do novo álbum dos franceses “Air”, não percebi o nome, mas a linha melódica que ouvia saltar no piano era o espelho do meu estado de espírito. Também não percebi a maior parte da letra, mas uma frase ressaltou entre várias:

“(…) don’t try to be on time (…)”


Uma frase que no meio da restante letra poderá ter todo o sentido, mas que eu, na altura, não descortinei qual… Mesmo após terminar a música, esta frase ressaltava como uma sentença na minha cabeça… “don’t try to be on time”… Infligidos pelo ritmo frenético que hoje em dia levamos nas nossas vidas, andamos constantemente a auto impormos uma disciplina horária em quase tudo o que fazemos… Chegar a tempo aos compromissos é uma tarefa diária e o pior é que muitas vezes transpomos essa atitude para além do trabalho, para o plano pessoal… “don’t try to be on time”, parecia-me uma premissa razoável… Acima de tudo o que eu precisava era de não ter de tentar chegar a tempo a que lado fosse, de encontrar o meu ritmo e sintonizar-me com o momento…

Este raciocínio levou-me a virar à direita naquele cruzamento que me levaria pelo caminho mais longo, mais sinuoso, para longe da via rápida e para perto do que é mais importante, os pinheiros que se debruçavam sobre a estrada e o leve balanço da erva nos campos que a ladeavam… Pareceu-me um caminho muito mais digno para as ondas que queria apanhar. Afinal, quantas vezes nos damos ao luxo de colocarmos as nossas exigências a este nível?

Espreitei a praia do Barbas e depois a do Marcelino, quebrava metro com alguns sets maiores… O ligeiro off-shore ordenava o mar, levantava as paredes e penteava para trás a espuma que se desprendia da crista das ondas… Num curto espaço de tempo, cinco minutos, talvez, vi três tipos a entubar numa secção que se formava um pouco mais para o inside, estava quase perfeito, porém, a assombrar este cenário idílico, estava um crowd desmesurado a dropinar constantemente – “Welcome to the real world!” – pareciam dizer-me.

Deixei-os uns com os outros e arranquei mais para Sul… afinal eu tinha tempo!

sábado, janeiro 06, 2007

De Sentidos Despertos

Pintura de Robert Heeley - El Capitan Picnic Table

O ano inicia-se e com ele a vontade de o começar bem... A vontade de não adiar os projectos que há muito deambulam na nossa cabeça como desejos a concretizar e ter a coragem e atitude de dar os primeiros passos nesse sentido...

Pintura de Reggie Holladay - Caribe

A ideia inicial deste blog sempre foi também o de trazer registado o que ando a fazer e que considero de válido. Por outro lado pretendia igualmente que esta exposição me servisse de estímulo para não deixar projectos a meio e dar-lhes a devida continuidade...

Pintura de Mike Doyle - Lined Up

Por diversas razões não tenho tido a disponibilidade desejada para aqui escrever, nem temporal, nem mental... Acima de tudo esta última... Penso que não há uma razão especial que a justifique, simplesmente não me apeteceu escrever por uns tempos... Todo o blog se tem construído com intervenções espontâneas e não queria, apenas para ser assíduo, forçar aqui a entrada de um qualquer texto feito "por que tem de ser"...

Pintura de Kevin Short - Last Session At Trestles

Sendo assim, acho que temos de respeitar estes tempos em que o espírito nos adormece e saber ser pacientes... o mar não nos está sempre a oferecer ondas, existe o tempo entre sets que é parte intrínseca da surfada e que há que saber aproveitar em pleno... para respirar fundo, para relaxar, recuperar forças para as próximas investidas e até para reflectir o melhor local para nos posicionarmos no line-up...

Pintura de John Comer - Palos Verdes Cove

Desde há uns dias para cá que ao pensar em determinadas questões me passa igualmente pela cabeça que deveria apresentá-las aqui... Era pois altura de voltar a escrever...

Vislumbro na linha de horizonte um novo set e os meus sentidos começam a despertar...